Entendendo o direcionamento da Lei de Execuções Penais no seu artigo quinto, no que se refere à individualização da pena, percebe-se a necessidade de se compreender a personalidade do indivíduo privado de liberdade, frente as suas mais variadas formas de manifestações.
Alerta-se então que este indivíduo não pode ser “rotulado” e as suas ações não podem ser cristalizadas, já que entendemos a personalidade como uma
estrutura dinâmica.

Enquanto Seres Humanos somos um universo de possibilidades, por mais disfuncionais que sejam as nossas atitudes. A violência é entendida como um comportamento extremo em nossos dias, mas também não podemos esquecer que em nossas raízes primitivas, este comportamento era necessário para a própria sobrevivência e perpetuação da espécie.
Por motivos sociais, genéticos e comportamentais, a violência foi, é e será um componente presente na história da humanidade. Indivíduos que manifestam esta violência durante suas relações sociais com mais persistência que os demais, percebem que este comportamento esta presente em suas vidas de forma intensa e demonstrando poucas possibilidades de controle, ou seja, entende-se que estes indivíduos são mais impulsivos, agressivos e com baixa tolerância a frustração no que se refere ao trato com os demais.
Estes indivíduos que possuem estas características,tem dificuldades de seguir normas e padrões éticos e morais, bem como de seguir e se adequar as normas sociais. Como conseqüência destes fatos,estruturarão paradigmas e normas específicas que possam lhes proporcionar ganhos pessoais e obtenção imediata de prazer.
Entendendo estas dimensões da personalidade, se consegue buscar evidências que corroborem com suas práticas criminais, entendendo ainda que não existe uma criminogênese, pois seria uma tentativa inadequada de se entender à ação criminosa.
O que se observa é que estes indivíduos seguem suas próprias regras e reagem impulsiva e inadequadamente ao meio. Não são criminosos natos, mas suas ações violam regras básicas que protegem a sociedade e seus membros, e é neste momento que são entendidos como criminosos.
Essas características comportamentais não são os únicos componentes pertencentes a este indivíduo,porém, muitas de suas atitudes são compreendidas como disfuncionais, se manifestando, quando este se sentir ameaçado, contrariado ou humilhado. Suas “ferramentas” de contenção demonstram ser insuficiente frente aos seus descontroles comportamentais.
Estes indivíduos tiveram um histórico de dificuldades nas suas inter-relações, por quererem adequar sua visão de mundo aos outros. Também demonstram ter pouca flexibilidade quanto a possíveis mudanças de atitudes e comportamentos mais funcionais em prol de uma coletividade.
Dentro desta observação, percebe-se que enquanto estavam no seio da sociedade com o direito de ir e vir, já possuíam essas dificuldades de relacionamento. Então já podemos imaginar como será dentro de uma instituição total como o sistema penitenciário. É neste momento que este indivíduo se vê preso, que suas condutas inadequadas e disfuncionais serão potencializadas até em prol de sua própria sobrevivência.
A partir deste momento ele se torna institucionalizado e com a possibilidade de sofrer um processo de despersonalização das características essenciais que lhe acompanharam durante toda sua vida.
Aqui podemos perceber a verdadeira e a grande importância de se compreender -como sugeri a LEP – os antecedentes e a personalidade do indivíduo privado de liberdade.
Dentro dos critérios clínicos no que se refere ao psicodiagnóstico, observou-se ao longo da história, a necessidade de se estabelecer características comportamentais que uma vez unidades, estabeleceriam uma idéia dos componentes estruturais de uma pessoa.
No ambiente forense é necessário se entender essas características e critérios. Não para “rotular” o indivíduo, mas para entender como ele é frente ao seu histórico de vida e como será seu padrão comportamental frente a sua privação de liberdade. Entender estas dimensões da personalidade no indivíduo é acima de tudo, uma demonstração de respeito a todo seu histórico pessoal, entendendo ainda como se deram suas relações frente a situações de conflito e estresse dos quais tenha passado.
Estudos demonstram que nas penitenciárias de todo o mundo, a grande porcentagem de indivíduos que lá estão, possuem um histórico de comportamentos anti-sociais. Estes comportamentos têm versatilidades e vários graus de ação. Assim, entende-se também que estes indivíduos são influenciados, por fatores sociais, biológicos e psicológicos para então agirem e reagirem a estímulos específicos de uma determinada maneira. Maneira esta que podemos entender como anti-sociais.

DA IMATURIDADE A MATURIDADE CRIMINAL

À medida que é constatada à fragilidade das relações humanas, a rigidez e a inflexibilidade perante os fatos e acontecimentos da vida, percebe-se que a compreensão da imaturidade comportamental esta instalada. O comportamento antiético e anti-social que é percebido em indivíduos que cometem crimes é diretamente relacionada à construção e estruturação de uma maturidade criminal. A maturidade criminal é inversamento proporcional à imaturidade comportamental. Esta é percebida principalmente nos ambientes carcerários, onde indivíduos com maturidade criminal são capazes de influenciar e contaminar outros indivíduos que não participem de sua estrutura. A convivência com outras pessoas nos leva a imitá-las, admirá-las, observá-las… Para repetir ou se diferenciar de seus comportamentos. O ambiente carcerário pode ser considerado como uma instituição social diferenciada e com regras de convivência que não são compartilhadas pela sociedade comum. Talvez o ambiente carcerário nos reagrupe como nas primeiras relações primitivas, onde o que mais tememos é o que mais nos ameaça.

Neste momento o que fala mais alto é a sobrevivência enquanto ser. Não importa o crime que foi cometido, pois a partir de agora haverá uma nova seleção natural. Podemos fazer um paralelo com grupos primitivos. Nestes grupos a liderança não era conquistada pelo passado ético, pela boa oratória ou pelos projetos para o futuro, mas sim, pela força e vigor físico, pela capacidade de destruir seus adversários e pelo temor que empunha aos outros. No ambiente carcerário há essa reprodução que faz parte de crenças enraizadas na história da humanidade. Não é a toa que percebemos grande violência em grupos de machos jovens, e este grupo corresponde a grande maioria dos indivíduos encarcerados. Por falta de opções e possibilidades, a imaturidade comportamental dará toda a atenção à possibilidade de se adquirir uma maturidade criminal. E é neste momento que se estabelece a escola do crime e a contaminação entre os indivíduos, onde a nova regra de vida será: “Se eu for temido e aprender a me impor, então poderei sobreviver”.

Professor Dr. Christian Costa, Ph.D.: Atua na área clínica e criminal há 24 anos. Procura relacionar ciência e prática na compreensão e intervenção de atos violentos, psicopatológicos e criminosos. Tem formação acadêmica em Filosofia e Psicologia (CRP SP 06/73995), com Especialização em Terapia Cognitiva pelo Instituto de Terapia Cognitiva de São Paulo; Aperfeiçoamento em Comportamento Homicida pela Universidade Nacional de La Plata (Argentina) e Mestrado pelo Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo na área de Psiquiatria Forense. Doutor pela PUC de São Paulo (Bolsa CAPES). Foi psicólogo responsável pelo setor de psicologia forense do Presídio da Polícia Militar de São Paulo de 2004 a 2012 e Colaborador do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça de 2006 a 2008. É Diretor do Centro de Estudos do Comportamento Criminal-CECCRIM e Perito Ad Hoc e Assistente Técnico. É consultor e palestrante em eventos científicos em todo o território nacional. É autor do livro “Se o Mal Tivesse um Nome”. Autor da Escala de Avaliação do Grau de Maturidade Criminal (Vetor Editora – em conclusão). Em parceria com o Dr. Kevin Beaver da Faculdade de Criminologia da Universidade Estadual da Flórida, tem artigos publicados no Journal of Criminal Justice. Foi coordenador do curso de Especialização em Psicologia Jurídica das Faculdades Educatie em São Paulo. Suas análises de casos de repercussão nacional podem ser vistas nos programas Anatomia do Crime no canal Investigação Discovery e Amazon Prime e no canal operação policial.

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